Por Marcos Neruber - Ascom/UFRN
Um estudo publicado na revista Nature, um dos periódicos mais importantes do mundo, pela pesquisadora do Centro de Biociências (CB) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Nilmara de Oliveira Alves, orientada pela professora do Departamento de Genética da UFRN Silvia Batistuzzo, mostrou com detalhamento inédito os danos na saúde ocasionado pela fumaça das queimadas na floresta Amazônica, cujos efeitos podem se estender por toda América do Sul.
Este estudo, fruto de uma colaboração de pesquisadores da USP, UFRN, Fiocruz e UFRJ mostrou como a exposição à fumaça causam danos ao material genético e morte das células pulmonares. Pela primeira vez, foi possível demonstrar que as partículas de queimadas da Amazônia ao entrarem nos pulmões aumentam a inflamação, o estresse oxidativo e causam danos genéticos nas células de pulmão humano.
“O dano no DNA pode ser tão grave que a célula perde a capacidade de sobreviver e morre. Ou esta célula perde o controle celular e começa a se reproduzir desordenadamente, evoluindo para o câncer de pulmão”, diz a pesquisadora Nilmara de Oliveira Alves, autora principal do estudo.
Para descobrir estes mecanismos, células de pulmão humano foram expostas a partículas coletadas na Amazônia e analisadas com técnicas bioquímicas avançadas, onde se mediu o grau de inflamação e de dano no DNA. “Estas células podem induzir autofagia (processo que indica estresse celular) e também sofrer lesões no DNA que podem contribuir para formação de câncer”, acrescenta Alexandre Vessoni, pesquisador do ICB-USP e atualmente da Universidade de Washington em St. Louis, nos EUA.
Neste trabalho, foram descobertos os mecanismos de morte celular e identificado um dos compostos responsáveis por isso. Quimicamente o composto químico reteno, um marcador de queimadas, tem um forte efeito na morte celular de células do pulmão.
“A Amazônia sofre com o desmatamento e queimadas, consequências de um processo de ocupação desordenado”, afirma o pesquisador Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP, coautor do estudo.
Todo ano, em setembro e outubro, os focos de incêndios disparam, e uma nuvem de fumaça que cobre toda a região amazônica, ocasionando sérios problemas respiratórios na população, como relatado em estudos anteriores coordenados pela pesquisadora Sandra Hacon, da FIOCRUZ-RJ, também co-autora do estudo.
Ela analisou dados do SUS e concentração de poluentes e observou uma forte associação entre queimadas e efeitos na saúde, mas não se conhecia os mecanismos pelos quais o dano no pulmão ocorre. Os pesquisadores coletaram amostras do material emitido na atmosfera pelas queimadas na região próxima à Porto Velho, uma das áreas mais atingidas pelos incêndios na Amazônia. Nessa fumaça, existe o material particulado, que é formado por uma mistura de compostos químicos.
O médico patologista Paulo Saldiva, professor da Faculdade de Medicina da USP e diretor do Instituto de Estudo Avançados da USP, explica que quanto menor a partícula, ela consegue penetrar mais profundamente no sistema respiratório, atingir os alvéolos pulmonares e ter contato com a corrente sanguínea, sendo mais prejudicial para a saúde.
A exposição ao material particulado é considerada uma das principais causas de câncer de pulmão de acordo com a Agência Internacional de Pesquisas sobre o Câncer (IARC), vinculada à Organização Mundial de Saúde. A poluição causada pela queima de biomassa na Amazônia emite compostos químicos que são diferentes dos poluentes emitidos pelos veículos automotores e pelas indústrias nos centros urbanos.
“Outra novidade deste estudo é que um dos compostos emitido somente pela queima de biomassa (o reteno) é um dos grandes responsáveis pelos danos no DNA que observamos nas células pulmonares”, afirma a professora da UFRN, Silvia Batistuzzo.
“No Brasil, onde ao longo dos últimos 30 anos observamos altas concentrações de material particulado na atmosfera como decorrência de emissões de queimadas, não há nenhum programa de melhoria da qualidade do ar decorrente da queima de biomassa. Nós esperamos que com estudos como este, incentive o monitoramento destas partículas finas que causa claramente danos à saúde”, finaliza Carlos Menck, professor do ICB-USP e também orientador desta pesquisa.
Esta pesquisa foi financiada pelo CNPq (Nº 471033/2011-1), Rede CLIMA (Nº 550022/2014-7), FINEP (Nº 01.13.0353.00) e FAPESP, através dos projetos: Nº 2014/02297- 3, 2014/15982-6, 2013/05014-0 e 2013/25058-1.
O título do artigo na revista Nature é "Biomass burning in the Amazon region causes DNA damage and cell death in human lung cells”.